quinta-feira, 28 de agosto de 2025

ESPREGUIÇADEIRA

 Quem me salvará quando meu corpo já não puder se erguer? Tudo ao redor apodrece devagar até as frutas, antes vivas, agora se entregam ao silêncio da decomposição. Ninguém parece notar que eu não consigo atravessar uma única noite sem que minha própria consciência, sombria e cruel, me empurre para o abismo. Sonho então, e nesses sonhos persigo enigmas que só gritam quando estou prestes a tocá-los, como espectros que recuam ao menor gesto de aproximação.

Pergunto-me se devo continuar neste caminho. Ele é árido, deserto, e eu, exausta de carregar tantos fardos, sinto meus braços desmoronarem. Quem ousaria me colocar em prioridade? Há algo de errado em mim, vivo anestesiada, e isso é uma tragédia que me veste todos os dias. Gostaria que alguém vigiasse meu corpo adormecido e dopado, para que eu não perturbasse a noite com meus ruídos sufocados. Alguém que ousasse me dizer que eu devo não mais sangrar sozinha. Mas não há. Sempre me deixam para trás, como se minha sina fosse correr atrás daqueles que se afastam cada vez mais, enquanto eu permaneço em minha velha cadeira descascada, testemunha silenciosa da vida que me escapa.

E, no entanto, mesmo entre ruínas, eu sempre carrego o amor, silencioso, quase secreto, como se fosse minha última chama. Mas temo sonhar apenas o meu próprio sonho, sem ninguém para habitá-lo comigo. É por isso que, todas as noites, antes que o dia termine, eu procuro minha estrela de esperança no céu, um ponto distante, frágil, mas ainda capaz de me convencer a continuar olhando para cima.

E o que é real, afinal, quando sussurro entre as sombras para não acordar ninguém, mas descubro que já fui abandonada? Então sigo, dopada, com a cabeça erguida em falso orgulho, fingindo não ver os pés em carne viva, abertos pelo excesso de correr da própria vida.