Eu gosto de descrever o infinito, mas é ele quem me
descreve.
Desce e sobe ruas escuras dentro de mim, acaba por encontrar
saídas que desconheço.
Uma noite pode ser longa, distante, dispersa e errante.
Errar um segundo e ser arrebata no outro, para um lugar de experiência
com o Nada.
O Nada vive no vazio, o mesmo não preenche, não desmancha,
nem dissolve em sangue.
A carne arde, escorre como um fio manso sobre a pele
manchada pelo desatento tempo.
O som do piano torna-se enlouquecedor, as grandes nuvens são
assopradas para o horizonte cinzento.
Cinza, mancha meus olhos, cheios de curiosidade, vontade de
ver o que me vê.
Enxergando um turbilhão de cores, o universo dança a melodia
da minha esperança.
A chuva cai...
E me lava, jorra felicidade pelos meus poros, vai limpando
bem devagar, sentindo meu corpo esfriar lentamente.
Lento é o processo que se dá quando eu fico imaginando uma
noite de chuva, com aqueles trovões dançando, fazendo um jogo de mímica no
reflexo da janela do meu quarto.
Eles trazem o segredo de uma sinfonia perdida, de um lugar
aonde as coisas não estão prontas.
De um lugar que sinto que já estive, como molécula, como
humana, como uma flor em um asfalto quente, cheio de entulhos, mas estou ali,
ou como um punhado de terra, junta, aglomerada, esperando um chute desapercebido
do destino para espalhar toda minha consciência.
Eu nunca tive medo de sumir, de fogo, de água ou de bicho
algum, meu medo se esvai quando aceito que a minha finitude se resume em
possibilidades.
Possibilidades me abrem, fazem fendas gigantescas na minha
alma, como se o cosmos rompe-se tudo aquilo que pudesse ter limite.
Eu não tenho limite, eu vivo e persigo aquilo de que preciso.
Espaço, aberto, acolhedor e curador, eis a minha
perseverança no que acredito,
Em Tudo, no Todo que se dá no ventre do Nada.