segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

:: A RACHADURA ::

 A rocha está se desfazendo...

Dentro, algumas coisas inacabadas começam a se destroçar.

Não existe uma linguagem que eu possa compartilhar a respeito desta destruição.

Mas meus olhos estão negros, estou cego, dentro de um corpo que está machucado.

Eu vim aqui de longe, caminhando por tanto tempo, que ando de lado, disfarçando em diálogos o que eu não consigo entender.

Estou quase sem mim mesmo, tentando despistar o oceano que quer me afogar.

As flores estão murchas, estou escutando os pássaros berrarem meu nome no horizonte.

Olhos negros, tentando encontrar um lugar em mim aonde exista luz para que eles não me apaguem.

A vida me escolheu, a morte me consagrou, agora permaneço em um caminho desconhecido.

Trocando sussurros por gemidos de euforia.

Eu gostaria de ser capaz de ir embora sem levar alguém comigo, mas isso não poderei escolher.

Acordei sentindo minha boca seca, conheci um outro eu, mecânico e engessado.

Cheio de traumas, encostado nas rochas, aonde a maré faz desenhos assombrados sobre a realidade.

Carrego um amor, uma busca, um diálogo com algo que eu não consigo me separar.

Estou em pedaços, procurando nos meus segredos obscuros, motivos para continuar a dar passos silenciosos pela praia de areia escura.

Todo mundo diz que eu costumo deixar as pessoas com os olhos úmidos e soletrando sobre a melancolia.

Eu aceito, estou sentado na frente da angustia e ela me quer de volta.

Aprecio as estrelas, desta vez, eu acredito que vou conseguir chorar.

Derramar algo que em mim, já deveria ter transbordado há anos.

Prazer em me conhecer, eu tenho uma infinidade de dores acumuladas, mas também, tenho esperança, tola que me transmite uma centena de agulhadas no coração.

Alguém poderia me amar, me ama e depois percebe que o amor é circunstancia de um cuidado que eu não consigo ter comigo mesmo.

Mesmo que alguém pudesse andar dentro de mim, se afogaria em minhas passagens secretas que não tem um fim.

É a última carta, os olhos estão quase fechados, esperando o último entardecer.

Começo a imaginar o que tem depois que meu corpo ficar gelado e eu conseguir não mais sentir meus músculos tentarem reagir.

No meu lugar secreto, eu imagino alguém vindo em minha direção, ela nunca chega.

De repente, as mãos dela estão sob meu peito, massageando um ego falido.

No meu lugar secreto, as luzes não se apagam, o sol não brilha só para mim, a lua é minha única saída para acalmar a escuridão.

Quanto tempo eu vou ter que acreditar que posso voltar a ser eu mesmo, definhando a cada amanhecer?

E eu preciso que minhas foras sejam suficientes para quebrar aquela rocha, estou com medo, porque estou muito alto e uma queda seria fatal.

Caso eu me deixe, eu vou acabar procurando alguém para tentar dizer o quanto a vida poderia ser mais calma e leve, vou invejar isso, mas irei me entregar, será a última vez.

Então eu grito, eu preciso reviver, renascer, reconhecer que já morri e que tudo isso é obra de um defeito de alma, aonde para o reparo só pode ser feito por dentro.

Me ajuda, estenda suas mãos, eu não vou estar tão pesado, estou tentando ir a algum lugar novo, para te levar as alturas.

Você me conhece, sabe porque eu sorrio com tanta vergonha, mesmo assim, os meus pedaços te chamam atenção.

Você me vê brilhar em um sol de 40 graus e minha pele gruda na sua alma, eu não quero te obscurecer.

Concentre-se, o silêncio será quebrado por meus passos alvoraçados ao anoitecer...

Estou fazendo sinal para um pedido de ajuda, estou chorando, esbarrando nas últimas paredes da realidade.

Olhando os cães ferozes correrem para devorarem o que sobrou da minha civilidade.

Estou dizendo, fique parada, eu vou voltar, mas estarei tão pequeno que você pode não me enxergar.

Sinto falta, a verdade é essa, sinto falta de uma verdade que não me condene.

Sinto falta, a verdade é essa, sinto falta de uma versão minha que não me iluda.

Estou fazendo sinal para um pedido de ajuda, estou chorando, esbarrando nas últimas paredes da realidade.

As verdades estão descolando meus ossos, minha virtude está indo embora.

Continuo dizendo que eu sinto falta de mim, estou tentando me segurar na ponta de seus dedos para não me perder para sempre.

A sua verdade me cura, sua sobriedade é tão surreal que eu estou pintado de escuridão, quando de repente, você ascende a luz e eu estou de volta outra vez.

Sinto falta, a verdade é essa, sinto falta de uma versão minha que fez com que eu me perdesse...